quarta-feira, 2 de agosto de 2017

Falando com as entranhas

Não me acostumo com o que não me faz feliz, revolto-me quando julgo necessário e encho o meu coração com a esperança de momentos melhores, mas não deixo que ele se afogue nela. Se achar que preciso de voltar atrás, volto, pois, como dizia Montaigne, a única forma de não cair no precipício é precisamente não dar o passo em frente e recuar.

Às vezes suponho erroneamente que já não consigo falar com as minhas entranhas, com as fibras que me forram o interior, mas, não raro, engano-me e reencontro sempre essa hábil capacidade, que pode ficar adormecida durante algum tempo, mas fervilha dentro de mim; e, cedo ou tarde, sempre emerge.

Em boa verdade, todos nós somos de algum modo prisioneiros das nossas emoções e da maneira como formámos os valores com que construímos a nossa personalidade. Devemos prestar sempre um tributo sério à coerência e à verdade; e, sobretudo, aceitar-nos como somos, não desvirtuando a estrutura vital da nossa personalidade, pois ela, uma vez formada e amadurecida, dificilmente muda.

Somos seres únicos, incapazes de ser copiados por quaisquer mimetismos de trazer por casa e essa diferença é uma das nossas maiores riquezas.

Nesta vida, das poucas coisas que podemos ter algum controlo e responsabilidade, é precisamente sobre o nosso comportamento, sobre as escolhas e decisões e de pouco vale imputar a outrem este ónus já que, para um adulto formado, viver é, sobretudo, escolher os caminhos e tomar decisões, com a plena consciência de que a inércia não deixa de ser ela mesma também a assunção de uma posição: o nada fazer.

Na base de qualquer conflito existe sempre um ou vários problemas e o conflito só será ultrapassado na medida em que os problemas a ele subjacentes sejam resolvidos - lógica pura e uma frase digna de La Palice, dirão os entendidos! Mas os problemas são sempre suscetíveis de ser abordados de uma forma lógica e racional e podem ser explicitados por um conjunto de fatores que permitam uma resposta ou solução – verdade que tenho hoje por assente – de forma a investir toda a energia na sua resolução.

Aconselho-me a mim mesmo, nesta hora impúbere da madrugada, fugir ao máximo do envolvimento na esfera emocional do conflito: o chamado efeito evitamento, pois é isso que desgasta, já que o que não tem remédio remediado está.

Tenho dito e agora vou dormir um sono de bebé, pelo menos assim o espero.

Jorge Rebelo

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Às vezes penso que não há chuva que me chegue, momentos que me bastem, nem sequer recordações de risos que me preencham. Por outras palavras...